Foi num dia bem qualquer que ela me perguntou como uma seta: “Amor muda?”. Primeiro fiquei surpresa com a intensidade da pergunta para tão pouca idade. Depois, levemente desconsertada pela pouca intimidade. Mas arrisquei. “Se nós mudamos a cada dia, a cada ano, a cada ciclo, creio que o amor deve mudar também”. Ela me estudou com seus olhos vivos. “Você já teve um amor que mudou não de tamanho, mas de forma?”. Aquilo estava ficando mais íntimo do que eu esperava.
“Sim”, respondi pensativa. Eu mesma nunca tinha me feito tais perguntas. Às vezes não pensamos em certas coisas pelo simples hábito de não pensar. Acomodamos todas elas no sofá e ligamos a TV.
As borboletas no estôbago algum dia param de bater suas asas. Lembrei-me de um livro que havia lido há pouco tempo. Uma das personagens, dessas bem a la Jane Austen, dizia que gostava de cuidar de sua casa e de seu marido. Que era feliz e se sentia protegida, o que mais podia querer?
Será que no fundo o que queremos é isso? Mesmo depois de tanta liberdade adquirita, novos ângulos e parâmetros, novos discursos?
Amar assim me pareceu mais um hábito.
Mas no final das contas o que queremos não é a tranquilidade de um amor? Não é isso o que realmente buscamos? Ele precisa passar pela resistência do tempo, soprado pela paciência, regado alimentado e fortificado para se tornar flexível e forte como o bambu.
A paixão, então, me pareceu fraca.
Ela continuou a tagarelar, mas eu já nem escutava. Já me havia perdido na bagunça que ela havia provocado.
Tive que retirar alguns pensamentos para lavar.